Unidos pela língua portuguesa

Parceria entre UFMG e Universidade de São Tomé e Príncipe (USTP) promove formação intercultural de professores


     

Institucional • Segunda-feira, 16 de Março de 2015, 13:49:00

Por Fabíola de Paula 

Em uma escola pública da ilha de São Tomé, na África, com pátio amplo e arborizado, as crianças brincam por todo o ambiente e até comem as frutas que dão nas árvores ali. Há um elemento deste espaço, porém, do qual elas ainda não se apropriaram tanto. “Percebo que as crianças não têm o hábito de colocar cartazes nas paredes das salas e nos corredores da escola”, observa a estudante de Pedagogia da UFMG Laís Reis, que realiza intercâmbio de dois meses em São Tomé e Príncipe.

Laís integra o segundo grupo de intercambistas de graduação da UFMG que participam do projeto “Formação de Professores brasileiros e santomenses e o aprendizado inicial da língua portuguesa pelas crianças santomenses”, sob a coordenação da professora da Faculdade de Educação (FaE) Francisca Maciel, resultado de parceria entre a UFMG e a USTP, integrando o Programa de Mobilidade Capes/AULP. Ao promover a ida de graduandos, mestrandos, doutorandos e professores da UFMG para o país africano, além da vinda de estudantes universitários santomenses para o Brasil, o projeto busca uma formação de mão dupla dos educadores dos dois países. “Durante essa experiência estou desenvolvendo um olhar mais observador sobre a prática escolar e, com isso, entendendo melhor o cotidiano do que seja ser professor”, conta Laís.

Em uma atividade com uma turma da 1ª classe (equivalente ao 1º ano do Ensino Fundamental no Brasil), Laís Reis pediu às crianças que se sentassem em roda para ouvir uma história. Enquanto narrava, fazia perguntas aos alunos, que respondiam e participavam ativamente. Em seguida, a turma ilustrou a história em um grande papel com muitas cores. E assim surgiu o primeiro cartaz daquela sala feito pelos próprios alunos. 

Conhecimento pela imersão

Na UFMG, o projeto é coordenado pela professora Francisca Maciel, que integra o Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita (Ceale) da FaE. Os trabalhos realizados por Francisca em países africanos, em especial em São Tomé e Príncipe, foram iniciados em 2006, quando tornou-se representante da UFMG para atuar na formação de coordenadores santomensese de Educação de Jovens e Adultos, na área da alfabetização, leitura e escrita. Nesse atual projeto, a proposta está voltada para para os anos iniciais da escola básica.

Segundo Francisca, o objetivo da parceria não é levar conhecimentos do Brasil para São Tomé e Príncipe. Pelo contrário, espera-se construir conhecimentos durante o projeto. Para isso, a imersão dos intercambistas é o ponto de partida. “Pela minha experiência, aquilo que chega pronto pode não ser bem assimilado, até por uma diferença cultural, linguística, assim como não é pertinente fazer uma ingerência”, afirma Francisca.

Bolsista da primeira equipe do projeto, que viajou no ano passado, a estudante de Pedagogia da UFMG Bárbara Fulgêncio descreve algumas características observadas nesse processo de imersão. “Eles têm o costume de ter aula de dança e a dança tem uma característica muito própria de São Tomé. Eles falam o português bem mais próximo ao de Portugal, mas também tem o crioulo. Os livros de lá são feitos em Portugal, mas trazem características de São Tomé”, relata.

Diante de tantas informações novas da cultura santomense, Bárbara observou ainda as carências de formação dos docentes da educação básica. Em São Tomé e Príncipe, a maioria dos professores de séries iniciais ainda não possui formação superior. “Eu já defendia a formação continuada e, depois de ir a São Tomé, eu vi a importância da formação básica e também da continuada”, afirma a estudante.

Caminhando para a autonomia

Segundo Francisca Maciel, apesar de encontrar diferenças culturais e muitas dificuldades no país, como a pobreza, a falta de saneamento básico e de infraestrutura, São Tomé e Príncipe vive progressos perceptíveis, dentre eles um maior investimento na área da educação: “Hoje chego lá e vejo a ampliação de acesso das crianças às escolas. Atualmente as salas de aulas estão lotadas. Em média,  45 alunos, por sala,  querendo aprender, felizes por estarem ali, apesar da falta de infraestrutura”, conta Francisca.

Para a coordenadora, uma das principais finalidades do projeto é contribuir para que São Tomé e Príncipe tenha autonomia para crescer sozinho. “São ilhas, a dificuldade que as pessoas têm de sair daquele país é muito grande. Então, se você tiver condições de ir proporcionar alguma coisa diferente aos santomenses, é muito bom”, comenta Francisca.

Foto do topo: Acervo de Laís Reis