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Interdiscursividade

Autor: Jane Quintiliano G. Silva,

Instituição: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais-PUC Minas / Departamento de Letras,

O conceito de interdiscursividade alinha-se à concepção de que os discursos se relacionam a outros discursos. Um discurso traz, em sua constituição, outros discursos, é tecido por eles, seja pelos já ditos, em um dado lugar e momento histórico, seja por aqueles a serem ainda produzidos. Isso significa que não há discurso homogêneo, fechado em si mesmo e dotado de uma fonte única do dizer. Ao falarmos, nossos dizeres são atravessados por outras vozes, por outras fontes enunciativas. O que se está dizendo, numa dada interação social, situa-se em uma rede interdiscursiva, toca em inúmeros fios dialógicos, impregnados de valores, de crenças, carregados de sentidos. Por exemplo, um professor, em uma reunião pedagógica, defende que ensinar e aprender é uma relação construída de mão dupla, em que tanto aluno como professor aprendem. As vozes que se deixam ouvir, na fala do professor, distanciam-se de um discurso que se nutre do sentido de que o único detentor de conhecimentos nessa relação é o professor. Pode-se olhar essa enunciação como um elo de uma rede interdiscursiva, que traz um já dito, citado, comentado, parafraseado, por muitos sujeitos que se filiam a esse discurso. A interdiscursividade aí também se constitui, porque esse discurso está em relação a outro discurso que, embora não se possa apreendê-lo por meio de pistas linguísticas, é tomado como uma contrapalavra.

A interdiscursividade também envolve discursos construídos por outros sistemas semióticos, como os dos domínios da pintura, música, dança, escultura e do cinema. No campo da pintura, por exemplo, a retomada de uma dada obra, por diferentes pintores, situados em lugares e momentos históricos distintos, pode levar à produção de novos objetos estéticos. O diálogo entre os quadros entra em uma rede interdiscursiva, pautada pelo trabalho com o já dito, já representado. Como exemplo, pode-se citar a Mona Lisa, de Leonardo Da Vinci, obra que suscitou inúmeras reproduções, paráfrases, paródias, gerando uma multiplicidade de efeitos de sentido.

Considerada uma propriedade constitutiva da existência do discurso, a interdiscursividade está diretamente implicada com a leitura e a produção de textos, práticas sociais que põem em funcionamento os discursos. Entender o encontro e/ou confronto de vozes é experimentar, como leitor, um trabalho de significar os já ditos, tomá-los numa rede de sentidos, situá-los à luz de suas condições de produção. Esse jogo, na produção de textos, pode demandar do enunciador uma negociação com as vozes, registradas, explicitamente ou não, na materialidade do texto. Nesse trabalho linguístico e discursivo, o enunciador constrói, a partir de uma posição enunciativa, um diálogo com o outro.


Verbetes associados:


Referências bibliográficas:
BAKHTIN, M. (VOLOCHINOV). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.
FIORIN, J. L. Interdiscursividade e intertextualidade. In: BRAIT, B. (Org.). Bakhtin: outros conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2006.
MAINGUENEAU, D. Gênese dos Discursos. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.
POSSENTI, S. Os limites do discurso: ensaios sobre discurso e sujeito. Curitiba: Criar Edições, 2002.

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