Transcrição fonética
Autor: Raquel Márcia Fontes Martins,
Instituição: Universidade Federal de Lavras-UFLA / Departamento de Ciências Humanas-DCH / Curso de Letras,
Uma transcrição fonética faz uso de um sistema de símbolos que visa representar a fala tal como ela é realmente produzida. Além de convencionalizar símbolos que podem transcrever vogais e consoantes de todas as línguas, uma transcrição apresenta também outros aspectos da pronúncia, como a tonicidade ou acento.
Para haver uma padronização das transcrições, os linguistas criaram um alfabeto específico que é conhecido como Alfabeto Fonético Internacional (International Phonetic Alphabet). Esse alfabeto é adotado no mundo inteiro para tentar representar, com mais precisão, os sons (fones) da fala.
Usando os símbolos desse alfabeto fonético, os sons transcritos são apresentados entre colchetes. Isso é o que ocorre na transcrição fonética destas palavras, como pronunciadas no dialeto mineiro: mala [ˈmalə], mole [ˈmɔlɪ], moça [ˈmosə] e moço [ˈmosʊ]. Nesses exemplos, o símbolo (ˈ) marca a sílaba tônica de cada palavra.
A transcrição fonética representa a fala de modo mais direto, em relações biunívocas somente, ou seja, em relações em que cada símbolo representa somente um som ou fone da língua. Desse modo, pronúncias diferentes para uma palavra – que é escrita de uma só forma na ortografia – podem apresentar transcrições distintas. Isso é o que ocorre com a palavra dia, por exemplo. Existe uma única forma ortográfica para a palavra, mas há ao menos duas formas de transcrição fonética, em função de pronúncias distintas: a transcrição [ˈdʒiə], para a pronúncia "djia", realizada no Rio de Janeiro (RJ) e a transcrição [ˈdiə], realizada em Campinas (SP), por exemplo.
Para o professor alfabetizador, é importante conhecer alguns princípios da transcrição fonética, tendo em vista que esse conhecimento poderá contribuir para uma melhor compreensão da influência fonética que se manifesta na escrita dos alfabetizandos. No processo de aprendizagem da escrita, é comum que eles compreendam, inicialmente, que a escrita é uma transcrição da fala, e por isso escrevem como falam, à semelhança de uma transcrição fonética. Nesse caso, grafias como “moli” e “mosu”, para as formas ortográficas mole e moço, respectivamente, são atestadas na escrita de aprendizes. As opções pelas letras “i” e “u” justificam-se porque a fala foi a referência. Romper com a ‘hipótese fonética’ dos alfabetizandos de que escrever é transcrever a fala, ou seja, de que fala e escrita são iguais, é fundamental para que eles possam apresentar uma escrita ortográfica, distanciando-se de uma hipótese ingênua que toma a fala como uma referência única e imediata para a escrita.
A transcrição fonética permite “visualizar” melhor a fala, por meio de sinais gráficos próprios, assim também como permite ao professor alfabetizador refletir melhor sobre os potenciais confrontos entre a fala (pronúncia) e as convenções da escrita (ortografia). Uma das principais consequências dessa reflexão é assumir que: (i) a hipótese fonética é frequentemente ativada pelos aprendizes (e também por usuários mais competentes) e (ii) o aprendizado das convenções não se processa com uma alteração da pronúncia.
Verbetes associados: Consoantes, Fala, Fone, Fonema, Fonética, Fonologia, Tonicidade, Vogais
Referências bibliográficas:
CAVALIERE, R. S. Pontos essenciais em fonética e fonologia. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.
CRISTÓFARO-SILVA, T. Fonética e Fonologia do Português: roteiro de estudo e guia de exercícios. São Paulo: Contexto, 2009.
OLIVEIRA, M. A. Conhecimento linguístico e apropriação do sistema de escrita. Belo Horizonte: Centro de Alfabetização, Leitura e Escrita – Ceal