Experiências a aprendizados em perspectiva
Seminário do PNAIC Pré-escola em julho teve o objetivo de avaliar os encontros realizados em 2018 e reivindicar a continuidade do programa
Acontece • Terça-feira, 10 de Julho de 2018, 14:03:00
Nos últimos dias 5 e 6 de julho, ocorreu o seminário final do PNAIC Pré-escola de 2018, voltado para avaliar os encontros que ocorreram em março, abril e maio deste ano. O evento ocorreu junto com o II Seminário do grupo de pesquisa Leitura e Escrita na Primeira Infância (LEPI), vinculado ao Ceale. O encontro teve o objetivo de refletir sobre os aspectos mais relevantes das atividades de formação que foram desenvolvidas. Desta vez, o evento recebeu formadoras e cursistas de diversas regiões do país para compartilhar o que foi desenvolvido em seus estados e também abriu espaço para a discussão de possíveis formas de continuidade da formação iniciada pelo PNAIC.
O primeiro dia, as atividades iniciaram com a abertura do grupo Slam Clube da Luta (confira o que são os slams na reportagem do Nexo). Em seguida, foi formada a mesa de abertura com a presença da diretora da Faculdade de Educação da UFMG Daisy Moreira Cunha; da gerente de coordenação da secretaria municipal de educação de Belo Horizonte Vânia gomes Michel; do representante da Undime Marcelo Wagner de Oliveira; da coordenadora estadual do PNAIC Kellen Silva Senra Nunes; da diretora do Ceale e coordenadora de formação do PNAIC Valéria Resende; da coordenadora do projeto Leitura e Escrita na Educação Infantil e formadora estadual do PNAIC Mônica Corrêa Batista; e da secretária da Educação de Divinolândia de Minas Wanderlaine Gleice Marçal Figueiredo.
A mesa agradeceu a todos que participaram da concepção do PNAIC e do próprio evento que reuniu as formadoras. Em sua fala, Valéria destacou também a importância do lugar da universidade pública na condução dos debates e discussões acerca da melhoria da educação básica. Para Daisy, “levamos muitos anos nesse país para chegar ao entendimento de que a gente precisa de políticas de Estado mais do que de políticas de governo. E esse evento aqui hoje eu compreendo [como] fomentando a chama para que essa política de estado que a gente levou anos e muita luta para construir não se esvaneça.”
O caminho até aqui
Depois de desfeita a mesa de abertura, foi formada a primeira mesa de discussão do dia. Com o tema “Linguagem escrita e o desafio da formação continuada de professoras da Educação Infantil”, Mônica Corrêa conduziu o relato das coordenadoras de formação e estaduais representantes do PNAIC Pré-escola em Minas Gerais. Elas compartilharam as experiências das universidades públicas do estado, apresentando aspectos positivos e também problemas observados na implementação e no desenvolvimento do Pacto. Além disso, foi abordado o trabalho desenvolvido no âmbito do LEPI, na cidade de Belo Horizonte. Também foi colocada em evidência a defesa pela matrícula de crianças de cinco anos de idade na Educação Infantil e não no primeiro ano do Ensino Fundamental, tema que está sendo julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Sobre a questão, Mônica defendeu que “precisamos convencer os ministros do STF de que essa é uma questão estritamente da política pedagógica e não do judiciário”, direcionando sua fala ao público formador.
Por uma continuidade
A movimentação pela permanência do PNAIC foi, com certeza, a protagonista dos debates na parte da tarde. Incluindo um abaixo assinado com o pedido de permanência do PNAIC e da formação continuada promovida que circulou durante o evento, a ser entregue ao Ministério da Educação (MEC), a mesma posição ecoou pelas mesas de debate.
A segunda mesa do dia foi dirigida pela coordenadora do Projeto Leitura e Escrita na Educação Infantil e professora da FaE/UFMG Mônica Baptista, e contou com a presença de Rita Coelho, do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CAED) da UFJF, de Maria Thereza Marcílio, consultora associada e fundadora da ONG Avante - Educação e Mobilização Social e de Marcelo Wagner de Oliveira, representante e vice-presidente da Undime-MG (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação) e Secretário de Educação de Carandaí (MG).
Antes do início da mesa que refletia o papel das universidades, dos municípios, dos estados e do MEC em um possível pacto pela qualidade na Educação Infantil (solicitado através de um abaixo assinado que circulou pelo evento) e, também, as perspectivas para o próximo governo, foi exibido um vídeo que dava continuidade à primeira mesa do dia. O vídeo retratava trechos de uma roda de conversa que aconteceu na Faculdade de Educação da UFMG sobre o curso Educação e Leitura na Educação Infantil e teve a presença de professoras e pedagogas de escolas da região metropolitana de Belo Horizonte. A professora Mônica explicou antes da exibição que o vídeo serviria para representar a avaliação de Minas Gerais do PNAIC 2018.
Políticas de formação
Após a exibição do vídeo, a fala foi passada a Rita Coelho, que iniciou agradecendo o convite e a oportunidade de traduzir, em debate, o que está sendo dito sobre a política de alfabetização. Rita defendeu que o projeto de leitura e escrita, a política de alfabetização e a política de melhorias na Educação Infantil estão todas juntas. Além disso, ela destacou sua crença de que para o PNAIC - e as políticas advindas dele - ter continuidade, é necessário que seja maior, discutido nacionalmente e mantenha-se uma rede articulada com posições sobre Educação Infantil.
Rita defendeu, ainda, a necessidade de uma referência nacional, pois, para ela, a discussão atualmente está muito dispersa institucionalmente. Ela citou como um exemplo de instituição o próprio Ceale, que, de acordo com a representante do CAED da UFJF, seria um exemplo forte para assumir esse papel. Por fim, Rita sustentou a importância da continuidade do PNAIC e sua ideia de que ele deva se tornar uma política de alfabetização que inclua a Educação Infantil e, além disso, a construção de uma política de leitura e escrita para a EI que não se reduza somente a própria leitura e escrita.
A mesa prosseguiu com a fala de Maria Thereza Marcílio, que iniciou reafirmando o lugar do qual ela falaria, o da formação continuada. Em sua exposição, Maria Thereza discutiu por onde passaria o pacto pela qualidade da EI, quem seriam os sujeitos e quais as suas responsabilidades. A fundadora da AVANTE destacou que o cenário atual infelizmente não é favorável para um pacto como esse. Ela citou como exemplo a crise política atual. Maria Thereza apresentou, ainda, a ONG da qual faz parte e suas propostas, como o Pralápracá, que é uma frente de formação de profissionais da Educação Infantil.
A próxima fala da mesa foi do representante da Undime, o professor Marcelo Wagner. O professor iniciou sua exposição apresentando a própria Undime e os trabalhos realizados pela Secretaria de Educação de Carandaí. Marcelo prosseguiu com sua fala discutindo as dificuldades estruturais de responsabilidade dos municípios que a Educação Infantil enfrenta. Ele disse, ainda, que é bastante necessário que haja debate entre os órgãos responsáveis pela educação - como secretarias, escolas e universidades, órgãos federais, entre outros - para pensar o Pacto.
A mesa foi encerrada com a fala da organizadora da mesa, Mônica Baptista, que defendeu que o debate ali proposto tem que ser pensado a partir do cenário político atual. A professora disse, ainda, que o MEC foi convidado a enviar representantes para a mesa, mas que o convite não foi respondido.
A terceira mesa do dia foi de relatos e reflexões sobre as experiências de formação em diferentes municípios, principalmente nas regiões norte e sul do Brasil. Estiveram presentes professoras da Universidade Federal do Ceará (UFC), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Uma colcha de retalhos produzida na formação proporcionada na UFFS foi estendida antes do começo da mesa, e nela havia os dizeres “Sensibilizar o olhar - PNAIC Educação Infantil”. A representante da universidade explicou que a colcha foi produzida nas reuniões de formação continuada: cada turma produziu uma colcha com desenhos e palavras que acreditavam que simbolizava a Educação Infantil, o PNAIC e a formação continuada. Amor, dedicação, alegria e ética foram algumas das palavras representadas. Nas experiências relatadas, o que predominou foi a vontade que o PNAIC continuasse.
Para além da ilustração
No segundo dia, a manhã foi iniciada com um bate-papo mediado pela professora e pesquisadora da Faculdade de Educação da UFMG Célia Abicalil e contou com a presença de três convidados: os escritores e ilustradores de livros infantis Graça Lima, Nelson Cruz e Marilda Castanha. Durante o diálogo, foram discutidas questões como a denominação “livro infantil”, com os convidados argumentando que ela muitas vezes é inadequada; questões envolvendo a classificação etária da literatura ilustrada; a ilustração como arte e seus pontos de contato com outras artes; o mercado editorial desses livros; o papel do livro ilustrado, entre outros. Para Graça, a literatura ilustrada também tem o papel de “abalar as certezas que se tem” e mostrar outros pontos de vista. Nelson afirmou que todo livro que ele ilustra é também um pouco biográfico, porque suas experiências de vida acabam sendo de alguma forma utilizadas em suas obras. Para Marilda, a leitura não é para ensinar, ela é arte; o conjunto do livro de ilustração é arte.
Após o bate papo, a organização do evento iniciou um sarau e convidou as formadoras do público a também lerem poemas. No início, houve uma dinâmica onde a leitura de um poema foi dividada entre a equipe que organizou o evento. O poema era sobre o PNAIC e foi escrito em formato de decretos e artigos, como leis, mas de maneira poética. Nele, era pedido amor, alegria, liberdade e várias outras coisas para o futuro.
Em seguida, foram recitados poemas de diversos autores como Manuel Bandeira, Adélia Prado e Clarice Lispector. Um poema intitulado “Poema de muitas vozes” foi escrito especialmente por uma das formadoras para o PNAIC. Nele, ela destacou alguns aspectos da trajetória do programa: “Foram tantas perguntas / tantas vozes juntas / Quanto espanto e rebuliço / leitura e escrita / que grande compromisso”.
Respeito à criança
A mesa do segundo dia teve como tema “Práticas de oralidade, leitura e escrita na Educação Infantil que respeitam as crianças e suas infâncias: como fazer?” e foi formada pela professora e pesquisadora da UFRJ Patrícia Corcino e por Carla Maline e Alessandra Souza da EMEI (Escola Municipal de Educação Infantil) Henfil.
A primeira fala foi da professora Patrícia Corcino que iniciou com a leitura da poesia “Eco” de Cecília Meireles e exibiu em seguida algumas obras sobre infância de Cândido Portinari. Patrícia seguiu sua fala reforçando o que está no material de formação: a criança deve ser o centro da proposta pedagógica. A professora disse que essa afirmação se tornou, e deve ser, um mantra. Afirmou, também, que as crianças devem ser protagonistas na EI e que é necessário que haja um deslocamento do conteúdo para a criança. “O professor precisa olhar o interesse da criança e a partir disso trabalhar”, afirmou.
Um segundo mantra, de acordo com Patrícia, são as “interações e brincadeiras como eixos do trabalho”. Para ela, os professores e professoras estão ainda muito focados no conteúdo em si e para mudar esse paradigma, o que não seria simples, é necessário que os docentes fiquem atentos à escuta a criança. Patrícia explicou que as interações no mundo infantil são feitas a partir da partilha, o tornar coletivo, e nos processos de produção de sentido que vêm a partir da descoberta do mundo. Isso, segundo ela, a criança faz brincando.
A pesquisadora defendeu que é necessário entender e não confundir brincadeiras com jogos dirigidos. Ela explicou que o último são aqueles jogos que vêm de fora, prontos. Patrícia afirmou que esse tipo de jogos é importante, mas as descobertas das brincadeiras espontâneas das crianças são ainda mais, pois são nelas que acontecem os processos de compreensão do mundo.
Outro ponto importante trazido por Patrícia tem a ver com a linguagem. Ela defendeu a importância de deixar a criança falar e demonstrar seus interesses. Além disso, a professora defendeu que na EI é preciso ampliar o universo imagético e da linguagem em seus diferentes formatos, pois isso seria o que nos constitui como sujeito. Por fim, Patrícia trouxe uma provocação para o público do evento: “estamos de fato fazendo esse deslocamento?”, se referindo à escuta a criança, ao deslocamento de conteúdo e ao protagonismo infantil.
Maior liberdade e autonomia para atingir o protagonismo
Em seguida, as professoras Carla e Alessandra da EMEI Henfil apresentaram a escola, que foi fundada em 1997, e o trabalho lá realizado, que tem como base “práticas discursivas orais e escritas com as crianças, com elas e para elas”. Respondendo à provocação do tema da mesa, as professoras disseram que o “como fazer?” seria através de muito estudo, tendo bons parceiros e interlocutores e, principalmente, fazendo junto das crianças, de toda a escola e da família.
Para exemplificar a vivência da escola, Carla e Alessandra mostraram experimentos envolvendo ciência que foram realizados na escola, alguns com ajuda de estagiários da UFMG. Um dos experimentos apresentados contou com o uso de um microscópio: as crianças observavam um bicho de pé na lâmina e depois desenhavam como é o inseto visto a olho nu e com a ajuda do microscópio. As professoras esclareceram que esse experimento, e todos os outros, foram feitos junto com as crianças, mas pel o olhar delas, favorecendo o protagonismo infantil e a descoberta individual.
Após o fim das falas de Carla e Alessandra, a mesa foi aberta para perguntas do público. Uma professora de Belo Horizonte compartilhou a dificuldade de dar protagonismo à criança em turmas grandes, como salas de aula com 20 crianças. A professora Patrícia aproveitou a oportunidade para questionar o modelo de educação atual: “o trabalho nem sempre é todo mundo junto fazendo a mesma coisa, esse modelo precisa ser questionado”, disse. Patrícia citou uma solução para essa problemática que seria a existência de cantos de atividades diferenciados. As professoras da EMEI completaram a fala da pesquisadora dizendo que realizam esse trabalho na escola. Elas disseram que isso permite ainda maior liberdade e desenvolvimento da autonomia da criança. “Educação Infantil tem que ser uma coisa mais livre”, afirmou Alessandra.
Confira na íntegra, em vídeo, o seminário final do PNAIC Pré-escola em nosso canal:
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