“A escola está sendo”
Arquitetos e pesquisadores debatem a distância contemporânea entre escola e cidade e as possíveis maneiras de solucionar essa questão.
Acontece • Quinta-feira, 03 de Outubro de 2013, 14:21:00
A relação entre a arquitetura da cidade e a escola foi pauta de discussão no segundo dia do IV Seminário Internacional Teias de Cidadania. A conversa começou com Beatriz Goulart, coordenadora do escritório ‘Cenários Pedagógicos’ de São Paulo, que faz pesquisas e projetos de espaços escolares e urbanos. Arquiteta, urbanista e pesquisadora, Beatriz discutiu a insustentabilidade da atual forma de organização escolar.
Consultora do MEC, ela contou que o órgão não proíbe mudanças na arquitetura, grade escolar e idade dos alunos por turmas, por exemplo, mas disse que as escolas têm medo de inovar por não saber o que irá acontecer. Há um desencontro entre o que se discute sobre os modelos pedagógicos e a estrutura das escolas. “É difícil a escola ser ponte se ela surgiu para nos proteger do mundo lá fora, não para nos integrar a ele”, diz a pesquisadora.
Mas como fazer para que a escola e a cidade sigam a mesma direção? Para Beatriz, precisamos desvincular a concepção de ensino de um santuário. Esse novo movimento de educação integrada é um exemplo disso, por trazer a cultura popular urbana e do campo também para dentro da escola.
Além disso, são necessárias novas legislações, porque elas ainda são feitas pensando no conceito de território como apenas um lugar: banheiro para fazer xixi, refeitório para comer. Será que se o banheiro fosse maior e mais iluminado, não daria para discutir higiene dentro dele e agregar mais valor ao aprendizado e ao espaço? Também é necessário mudar os métodos de avaliação e analisar como os meninos e meninas se revelam como sujeitos, diferente do modo como tem sido feito até agora.
“Precisamos fazer isso junto com toda a comunidade escolar e do bairro. Só haverá legitimidade se todo mundo der sua opinião. O espaço escolar, que era o espaço da ordem, tem que virar um multiespaço educativo, onde acontecem várias coisas ao mesmo tempo. É a simultaneidade da possibilidade”, argumenta Beatriz.
Roberto Andrés, arquiteto e professor da UFMG, trouxe um questionamento sobre o que estamos ensinando com a cidade que temos construído. “Quem vai expandir sua prática pedagógica para uma cidade que é feita para carros, não para pessoas?”.
Para Roberto, que também é editor da PISEAGRAMA, revista bimestral sobre os diferentes espaços públicos, esse é um progresso que gira em círculos e não vai a lugar nenhum. Não só a paisagem, mas também a questão do transporte é importante para integrar educação e cidade - além do que, transporte também é um direito social.
Ele deu o exemplo do Boulevard Arrudas, em Belo Horizonte, onde, para abrir espaço para os carros, estão cobrindo um elemento paisagístico importante: o rio. Enquanto isso, em Seul, Coréia do Sul, acontece o contrário: várias avenidas foram destruídas para abrir espaço para os rios que passavam por baixo. Uma solução importante seria investir mais em transporte público, o que diminuiria o número de carros na rua, trazendo assim mais conforto e segurança para a escola se expandir para a cidade.
Ramón Moncada Cardona, pedagogo e diretor da ONG Conciudadania, de Medellín, na Colômbia, completou dizendo que a cidade é uma criação humana. O resultado é nossa responsabilidade e podemos mudar seu futuro. Ramón lembra que a educação vai muito além da escolarização: a cidade tem diversos espaços, processos e ambiente educativos, formais e informais. Ela é um grande sistema de educação e aprendizagem, onde não é só o professor que ensina e não é só o aluno que aprende. Precisamos aprender a inserir a cidade na escola e a escola na cidade. O pedagogo deu sugestões para que isso ocorra, como a participação da escola nas atividades comunitárias e expedições pedagógicas pela cidade.
Para concluir ele citou Paulo Freire, dizendo que a cidade não é, a cidade está sendo. E completou: a escola também não é, a escola está sendo.
Imagem: Teias de Cidadania