"A ideia do cânone ser melhor causa muitos problemas"

Na abertura do Jogo do Livro, professor Peter Hunt defendeu maior relativização ao se qualificar os livros infantis


     

Acontece • Quinta-feira, 19 de Novembro de 2015, 19:07:00

Na abertura do XI Jogo do Livro e I Seminário Latino-americano: Mediações de Leitura Literária, o professor Peter Hunt, da Universidade de Cardiff (Reino Unido), começou pedindo desculpas pelo título de sua palestra. "Textos para crianças, leitura infantil e o problema da literatura" era o tema, e o conferencista explicou que o problema a que se refere não está nos livros infantis, mas na palavra literatura, que, nesse âmbito, "mais causa problemas do que resolve". 

"Há pessoas que pensam que livros infantis não são sérios, mas eles são complexos e estudados no mundo todo". Sua importância vai desde o fato de formarem as crianças, até as experimentações estéticas e tecnológicas que permitem. O problema a que Hunt se refere estaria na valoração que é feita dos livros para crianças a partir de uma noção de 'literatura' como produto superior. "A ideia do cânone, do clássico ser melhor que outros livros está muito arraigada e causa muitos problemas."
 
"Nós temos crianças que querem ler de tudo, ansiosas por isso, e uma sociedade adulta que diz que ela tem que gostar do clássico", alertou. Hunt propõe que é preciso olhar para os diferentes livros com um olhar igualmente receptivo, e encontrar o que há de bom, o que desperta o interesse da criança, em cada obra. A avaliação e as escolhas literárias devem, portanto, trocar uma escala absoluta (que classifica entre bom e ruim) por uma relativa e contextualizada (que traga a ideia de 'bom para...').
 
Ao final, Hunt destacou que a emergência de novas tecnologias e da multimodalidade nos coloca em um momento crucial em relação ao lugar do livro na sociedade, comparável apenas à invenção da prensa móvel, há mais de 500 anos. "As crianças estão pensando de modo diferente". "Na minha idade, ver um clipe de música é uma revelação", brincou o conferencista, para dizer que as novas gerações experimentam "uma nova forma de entender uma narrativa". "Falar que o livro é melhor que isso é uma forma de matar o livro", concluiu.