Cenários educacionais no contexto da pandemia

Editorial | Letra A 55


     

Letra A • Terça-feira, 01 de Março de 2022, 22:24:00

 
A situação de pandemia certamente impôs uma série de desafios para o cotidiano das pessoas e das instituições. Rotinas da vida familiar foram alteradas em função de precauções relacionadas ao cuidado com a saúde e à busca por novas formas de trabalho, o que para muitos significou (e significa) um reposicionamento de ocupações laborais indicado pela criação de alternativas de sobrevivência e, também, pela modificação de espaços da casa, por exemplo, que passa a ser adaptada às esferas do trabalho e, mais visivelmente, às esferas escolares. 
 
Tempos e espaços de ensino e de aprendizado sofreram alterações que afetaram tanto a vida dos alunos quanto a vida dos professores. Estratégias de interação foram e são mobilizadas nos vários segmentos de ensino, com variadas alternativas que consideram diferenças em relação aos anos escolares e às condições materiais de manutenção de uma desejável ‘rotina’ institucional que garanta um grau de contato desejável para que processos de aprendizagem sejam mantidos. Isso ocorre, mesmo em condições tão adversas, especialmente quando se pensa na situação econômica das famílias brasileiras de baixa renda em que a aquisição de computadores e o acesso à internet são horizontes ainda longínquos. Seguramente, a popularização do uso do celular talvez tenha sido um traço garantidor de canais de comunicação entre as instituições e as famílias, mas está longe de representar uma solução para o desenvolvimento, nesse contexto pandêmico, de rotinas institucionais próximas das ideais. O fato é que os desafios são muitos e de variadas ordens, o que tem provocado reflexões sobre as dimensões políticas e educacionais desse momento histórico, redimensionando parâmetros para uma inclusão digital mais ampla que considere esse perfil variado de usuários, incluindo estudantes e professores. Nessa direção, o debate sobre o chamado ‘ensino remoto’ não pode desconsiderar possíveis tensões entre as culturas impressa e digital. Essas tensões reverberam em alterações nas práticas escolares de leitura e de escrita, já que o próprio gênero ‘aula’, tão definidor da instituição escolar, passa por mudanças e, por um lado, considera a produção de materiais de ensino e de rotinas caracterizadoras da tradição da instituição, mas, por outro lado, se vê pressionado pela emergência de novos cenários marcados pela virtualidade e pela instabilidade das interações, o que representa um desafio de adaptação para todos os envolvidos em um projeto de ensino e de aprendizagem. 
 
O jornal Letra A, sensível aos desafios que se apresentam no cenário educacional contemporâneo, abre espaço para o debate sobre as dimensões políticas que orientam as escolhas pedagógicas em um momento histórico que exige alternativas marcadas pela pluralidade de soluções. No entanto, essas soluções não podem estar ancoradas em um determinismo tecnológico que defende apenas a presença de computadores e internet como um caminho para o que se pretende ‘remoto’. Seguramente, o papel do professor é dos mais relevantes para potencializar os processos de aprendizagem, quer seja na construção de um projeto de ensino que posicione a centralidade do aprendiz, quer seja na organização de propostas didáticas que estejam sintonizadas com a diversidade cultural instaurada por multiletramentos que demandam a presença de variados textos. Por meio de diversas práticas de leitura e de escrita, poderão ser feitas reflexões que encaminhem percepções das aproximações e dos distanciamentos entre as várias materialidades do discurso. Por isso, continuam salutares as iniciativas que buscam trocar experiências e ideias sobre os cenários educacionais no contexto da pandemia, sempre emolduradas pela busca da compreensão das razões políticas e sociais que justificam as nossas escolhas e as nossas propostas.