Desmonte na educação brasileira | parte 3


     

Letra A • Domingo, 23 de Outubro de 2022, 13:47:00

 
Será uma conquista?!
 
Mesmo com duras perdas ao longo dos últimos cinco anos, a educação básica respirou aliviada com a aprovação do Novo Fundeb. A votação realizada no dia 21 de julho de 2020, ainda com o Ministério da Educação sob comando de Abraham Weintraub, aprovou a PEC 26/2020, que amplia gradualmente a destinação de verbas federais com os gastos em educação e torna o Fundeb permanente. A complementação, que hoje é de 12%, deve atingir 23% a partir de 2026. 
 
César Callegari lembra que a aprovação não foi consensual e é decorrência de muita luta, já que “Bolsonaro e seu ventríloquo, Paulo Guedes, são contrários aos gastos com educação; foi graças a uma intensa luta dos educadores brasileiros, dos estudantes brasileiros e das forças vivas que entendem a educação como um fator estratégico para o desenvolvimento, que conseguimos resgatar o Fundeb e introduzi-lo como fator permanente na Constituição”. Todavia, os ataques ao financiamento à educação são constantes: a Câmara Federal aprovou a Lei Complementar 11/20, advinda do governo Bolsonaro, que tende a reduzir as receitas vinculadas à educação, relacionadas ao ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) por meio do congelamento do imposto. Segundo César, o ICMS é a principal renda do Fundeb, e está relacionada, sobretudo, com os combustíveis. Assim, todas as vezes que estados e municípios arrecadam menos imposto sobre a gasolina, com intenção de baratear essa mercadoria, o Fundeb perde recursos. 
 
Catarina de Almeida reforça que a falta de financiamento para a educação está relacionada com o projeto de não garantir educação de qualidade para a população brasileira. “A gente não tem educação de qualidade por falta de financiamento? Nós não temos financiamento porque não queremos uma educação de qualidade. O que sempre fizemos com a educação no Brasil foi: eu tenho esse recurso para a educação, e será essa a quantidade que definirá qual a educação que teremos. A lógica precisa ser invertida, a educação que nós precisamos e temos direito é a que a constituição nos assegura, então precisamos de um financiamento correto para alcançar a educação de qualidade e o estado brasileiro deveria garantir isso”, enfatiza a professora.
 
“A educação para esse governo representa uma ameaça”, defende Callegari. “Um dos principais pontos é a guerra ideológica que ele trava em relação a tudo aquilo que representa progresso e respeito à diversidade e às políticas de inclusão”. Para o sociólogo, o governo é um autodeclarado inimigo da educação e as declarações, que são seguidas de um conjunto de práticas, programas e ações concretas, têm efeitos permanentes aos direitos educacionais dos estudantes brasileiros, dos profissionais de educação e das instituições educacionais do país.
 
“Para não dizer que o governo Bolsonaro não tem projeto para a área de educação, eu quero dizer o seguinte: eles possuem um projeto, um projeto de desmonte, é esse o projeto do governo Bolsonaro para a educação brasileira. O desmonte da estrutura pública de ensino com vistas à privatização crescente desse setor desde o governo Temer”, destaca o intelectual.
 
 
Os parâmetros da educação básica no Brasil no último século
 
1937: Criado o Instituto Nacional do Livro, hoje conhecido como PNLD.
 
1961: Aprovação da primeira LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
 
1962: Cria-se o primeiro PNE (Plano Nacional de Educação).
 
1988: Promulgação da Constituição Federal.
 
1990: Criação do Saeb (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica), primeira iniciativa, em escala nacional, para se conhecer o sistema educacional brasileiro em profundidade.
 
1996: Nova LDB, que estabelece normas para todo o sistema educacional, do ensino infantil até o ensino superior, e também da Educação Escolar Indígena. 
 
1996: Instituição do Fundef (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério).
 
1997: São publicados os PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais), que dispunham sobre os currículos escolares.
 
1998: É publicado o RCNEI (Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil), com objetivo de esclarecer o que deve ser ensinado nessa etapa da Educação Básica.
 
1998: Criação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), usado como instrumento de avaliação do desempenho dos alunos e das escolas. 
 
2001: Novo PNE (Plano Nacional de Educação), que estipulava metas para aumentar o nível de escolaridade dos brasileiros e garantir o acesso à Educação.
 
2003: Criação do Programa Brasil Alfabetizado (PBA) para combater o analfabetismo no país.
 
2006: É instituído o ensino fundamental de 9 anos, com matrícula obrigatória aos seis anos de idade.
 
2008: Implementação da PNEEPEI (Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva). Ela estabelece que é dever do Estado a efetivação e a garantia de um sistema educacional inclusivo em todos os níveis educacionais.
 
2009: Emenda Constitucional nº 59, que determinou a ampliação da obrigatoriedade escolar para 4 a 17 anos até 2016. 
 
2012: Instituído o PNAIC (Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa), um compromisso formal assumido pelos governos federais, estaduais e municipais de assegurar que todas as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino fundamental.
 
2014: Nova regulamentação do PNE (Plano Nacional de Educação), com vigência de 10 anos.
 
2016: Aprovação da Emenda Constitucional nº 95, que estabelece o teto de gastos do governo, prejudicando assim o repasse de verba para a educação.
 
2016: Portaria 1.145, de 10 de outubro de 2016, que institui o Programa de Fomento à Implementação de Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI).
 
2017: Homologação da BNCC (Base Nacional Comum Curricular), que estabelece um currículo de ensino nacional. As primeiras versões do documento foram produzidas, discutidas e publicadas em 2015, ainda no governo de Dilma Rousseff.
 
2017:  Lei n° 13.415/2017 altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e cria o Novo Ensino Médio. 
 
2018: Regulamentação da Política Nacional de Avaliação e dos Exames da Educação Básica, concentrando todas as provas no Saeb. Deixaram de existir: Avaliação Nacional de Educação Básica (Aneb), Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc), conhecida como Prova Brasil, e a Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA).
 
2019: Alterações no edital do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), permitindo a presença de publicidade nas obras didáticas, ausência da temática de violência de gênero e não exigência de referências bibliográficas.
 
2019: Criação da PNA (Política Nacional de Alfabetização). A política reforça as atividades de pré-alfabetização e prioriza um único método de alfabetização.
 
2019: O orçamento do Ministério da Educação (MEC) para 2020 prevê uma queda de 54% nos recursos destinados ao apoio à infraestrutura para a educação básica, se comparado à proposta apresentada em 2018.
 
2019: Criação do Pecim (Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares), programa que prevê a criação de 200 escolas cívico-militares até 2023.
 
2020: É apresentada a nova PNEE (Política Nacional de Educação Especial), incentivando a matrícula dos alunos com deficiência em escolas especiais e não em escolas regulares de ensino.
 
2021: Novo edital para o PNLD, que retira trechos acerca da violência de gênero e da diversidade social brasileira.

 

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