Dicionário de Alfabetização: Multilinguismo
Edição 50 do Letra A
Letra A • Sexta-feira, 13 de Julho de 2018, 13:09:00
Por Maria Gorete Neto – Professora da Faculdade de Educação da UFMG e pesquisadora do Ceale
Nos últimos trinta anos, a Linguística Aplicada e a Sociolinguística vêm questionando a noção de multilinguismo. Inicialmente, multilíngue seria o sujeito com o domínio pleno de várias línguas, sem a interferência da língua materna. Essa concepção apoia-se no pressuposto essencialista de língua como sistema estruturado, fixo e abstrato. A globalização, o desenvolvimento do pós-modernismo e do pós-estruturalismo ensejam uma nova compreensão de ‘língua’ como recurso semiótico multifacetado, fluido, criado e recriado nas práticas comunicativas das quais os falantes tomam parte. Assim, multilinguismo não se refere ao uso harmônico e homogêneo de várias línguas e nem o falante funciona como se tivesse vários monolíngues dentro dele.
Trata-se de fenômeno complexo, dinâmico, poroso que envolve múltiplas práticas discursivas, em diferentes modalidades, que o multilíngue mobiliza para construir significados. Nesses usos que faz das línguas, o falante atribui sentidos vários a seus enunciados, constrói e remodela identidades. Sob esse ponto de vista, o multilíngue possui um repertório linguístico do qual seleciona as características mais estratégicas para uma comunicação efetiva em determinado contexto. Essas estratégias podem ser, por exemplo, utilizar empréstimos linguísticos, misturar as línguas ou alternar de uma língua para outra. Em contextos de ensino, multilinguismo assim compreendido permite romper com a ideia de sujeito multilíngue ideal e de língua legítima, correta ou apropriada.