IV Congresso Brasileiro de Alfabetização movimenta debates sobre problemas e avanços no ensino da leitura e escrita

O encontro reuniu professores, pesquisadores, graduandos, pós-graduandos e entidades sociais durante três na UFMG


     

Acontece • Quinta-feira, 22 de Agosto de 2019, 14:22:00

 
Durante os dias 08, 09 e 10 de agosto, foi realizado o IV Congresso Brasileiro de Alfabetização (CONBAlf), promovido pela Associação Brasileira de Alfabetização (ABAlf) e pelo Ceale. A quarta edição do congresso trouxe um questionamento como tema principal: Qual alfabetização para qual tempo? O evento, que contou com a presença de mais de 700 participantes, possibilitou debates e troca de ideias sobre os processos, práticas e estudos realizados sobre a alfabetização em todo país.
 
A mesa de abertura teve a participação de Benigna Oliveira, pró-reitora de graduação da UFMG, Daisy Cunha, diretora da Faculdade de Educação (FaE) da UFMG, Ângela Dalben, secretária Municipal de Educação de Belo Horizonte, Iara Pires, assessora da Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais, Andrea Moreno, coordenadora do Programa de Pós-graduação em Educação da FaE/UFMG, Francisca Maciel, diretora do Ceale e Isabel Frade, presidente da ABAlf.
 
 
Mesa de abertura contou com autoridades da área da Educação
 
Em sua fala, Isabel Frade destacou a importância de todas as entidades e demais presentes estarem reunidos para o debate sobre a alfabetização e falou sobre algumas políticas de retrocesso que atingem a área da educação atualmente. Para Isabel, a proposta de diálogo é um dos principais pontos que motivam a realização do evento como um espaço necessário para reflexão, principalmente sobre as relações entre analfabetismo e desigualdade social. Leia aqui na íntegra carta aberta redigida pela diretoria da ABAlf encaminhada ao Ministério da Educação (MEC). O documento repercute discussões realizadas durante o evento e traz um posicionamento da Associação diante das mudanças que vêm sendo realizadas na Educação. 
 
 
Magda Soares recebeu placa em homenagem às suas contribuições para a alfabetização
 
Seguindo, realizou-se uma homenagem à professora Magda Soares, presidente de honra da ABAlf e fundadora do Ceale, através de uma carta aberta realizada pela professora Francisca Maciel, realçando a sua luta constante pelo direito de todas as crianças a ler e a escrever. Magda, representada pela professora Aparecida Paiva, recebeu uma condecoração por suas importantes contribuições à alfabetização e à educação ao longo de todos esses anos.
 
Orientandas de Magda Soares ao longo de sua carreira

Após a homenagem à Magda Soares, o Grupo Movência, da Faculdade de Educação da UFMG, realizou a apresentação cultural "Histórias de bichos e encantados", um projeto do grupo de contação de histórias. 

Integrantes do Grupo Movência cantaram e contaram histórias
 
Alfabetização em outras (e muitas) perspectivas
 
Logo após, foi iniciada a conferência de abertura do CONBAlf, apresentada por Uta Papen,  professora da Lancaster University, que abordou o tema “Letramento em crise? Política de alfabetização, prática e pesquisa na Inglaterra e outros países anglófonos” trazendo uma perspectiva dos processos de alfabetização e de seus respectivos obstáculos. De acordo com Uta, as políticas governamentais na Inglaterra promovem uma prioridade exclusiva ao desenvolvimento do método fônico intuitivo como principal caminho para a leitura e escrita de alunos. Com isso, há um certo descaso com essas práticas de alfabetização, segundo a professora, que se torna mais evidente quando se percebe que é um problema que atinge, principalmente, as classes mais baixas da população, de modo a evidenciar a desigualdade de ensino existente. 
 
A professora Uta Papen estuda alfabetização e letramento na Inglaterra e nos Estados Unidos 
A primeira mesa do evento, “Qual perspectiva multidisciplinar favorece a alfabetização?”, foi composta por Margarida Alves, professora do Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida em Portugal, Ana Smolka, professora da Universidade Estadual de Campinas e Artur Morais, professor da Universidade Federal de Pernambuco, com o professor Lourival Martins, da Universidade do Estado de Santa Catarina, mediando a mesa. Nas discussões realizadas, a alfabetização foi tomada como um processo em que há a presença de diversas áreas se relacionando em uma multiplicidade de formas. Além disso, de acordo com Margarida Alves, possuir um conhecimento sobre as diversas concepções criadas pelas crianças sobre o modo de construção é um meio importante para trabalhar a pluralidade de saberes interligados na alfabetização e superar a perspectiva unidisciplinar que ainda é muito priorizada em diversos contextos escolares.
 
Primeira mesa do IV CONBAlf discutiu multidisciplinaridade
Em seguida, foi realizada a mesa de entrevista com professoras alfabetizadoras de escolas públicas municipais do país. Rúbia Alves, professora no município de Belo Horizonte (MG), Mirucha Lima, professora no município de Nísia Floresta (RN) e Sonia Dias, professora no município de Belém (PA), responderam a questionamentos sobre “Como os professores alfabetizadores lidam com os diferentes paradigmas em sua prática?”. A conversa girou em torno dos apontamentos das diversidades e, consequentemente, dificuldades vivenciadas pelas docentes em suas atividades em sala de aula. A consideração dos contextos e individualidades de cada aluno foi uma questão tratada pelas três professoras como essenciais para um desenvolvimento da alfabetização. As professoras, contando com a mediação de Adelma Barros, da Universidade Federal do Amapá, Denise Lopes, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Elizabeth Lucio, da Universidade Federal do Pará, também relataram suas vivências em práticas e projetos que buscam aplicar em suas escolas.
 
Professores da rede pública de diferentes estados do país discutiram suas práticas em mesa da tarde
 
Inserção e apropriação 
 
No segundo dia, a mesa que iniciou as apresentações tratou sobre os Tempos e processos de apropriação da escrita, debatendo a inserção da criança no mundo da escrita a partir de perspectivas teóricas e práticas, considerando questões sociais e aspectos da linguística como fundamentais para a compreensão dessas etapas pelo aluno. A discussão contou com a participação de Sara Mourão, da Universidade Federal de Minas Gerais, Ana Miranda, da Universidade Federal de Pelotas, Anna Oliveira, da Universidade Estadual Paulista, e Patrícia Corsino, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
 
 
Mesa do segundo dia trouxe Educação Infantil para discussões sobre apropriação da escrits
 
Na parte da tarde, ocorreram as sessões de comunicações de pesquisas e relatos de experiência, com apresentações de trabalhos em oito eixo temáticos: alfabetização e políticas públicas; alfabetização e história; alfabetização, diversidades e inclusão; alfabetização e infância; alfabetização e educação de jovens, adultos e idosos; alfabetização, cultura escrita e outras linguagens; alfabetização e formação de professores; e alfabetização e modos de aprender e de ensinar. Em breve, serão publicados os anais dos trabalhos.
 
Salas do CAD 1 foram ocupadas por discussões sobre alfabetização no segundo dia do evento
 
Escrita e leitura no meio digital
 
No terceiro dia do IV CONBAlf, as atividades começaram com a assembleia anual da ABAlf, aberta a todos os participantes. Os participantes associados à ABAlf tinham direito à voto nas decisões tomadas. 
 
Em seguida, ocorreu a mesa “Alfabetização em tempos digitais”, com o professor Dagoberto Arena, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), e a professora da UFMG Isabel Frade. Dagoberto focou sua fala em reflexões sobre o objeto da escrita e o ensino da leitura e da escrita no contexto digital a partir da visão que apresentou. 
 
O professor da Unesp argumentou que a escrita tem origem na imagem e que esse aspecto precisa ser levado em conta no ensino da leitura e da escrita. “Nossa escrita, apesar de ter uma aparência totalmente alfabética, também tem o componente figurativo. Ela também é figura, imagem”, afirma. Para Dagoberto, a linguagem digital e a escrita dos dispositivos digitais e dos aplicativos estão desvelando e redescobrindo “a natureza de imagem apagada ao longo dos séculos”. Isso, para ele, abre possibilidades de ensino para as crianças.
 
 
Mesa do último dia abordou impacto do digital na alfabetização 
 
A professora Isabel Frade discutiu as implicações das novas tecnologias digitais para a alfabetização, fazendo reflexões sobre as conceituações dos novos fenômenos surgidos na interação entre leitura e escrita e meio digital. Isabel refletiu sobre quais práticas envolvendo cultura escrita digital são vivenciadas por pessoas que estão no processo de alfabetização e como as crianças têm aprendido no mundo contemporâneo. 
 
Para a professora da UFMG, cenas, signos e gestos da cultura digital já estão incorporados, mas o conceito de alfabetização digital não é fácil de construir, devido às mudanças rápidas no acesso e nas práticas. Isabel fechou sua fala com exemplos de pesquisas que participou e orientou que analisaram a relação das crianças que estão sendo alfabetizadas com os usos da escrita digital.
 
Teorias em perspectiva
 
Após a última mesa, ocorreu a conferência de encerramento do evento, que foi realizada pela professora Anne-Marie Chartier, da École normale supérieure de Lyon. A professora Isabel Frade a introduziu destacando sua importância para os estudos das práticas de ensino e da história da alfabetização.
 
A professora Anne-Marie Chartier é referência nos estudos sobre práticas e história da alfabetização
 
Em sua fala, Anne-Marie abordou a temática “perspectiva teórica: os modelos concorrentes de análise sobre o fracasso em leitura e escrita”. Antes de discutir os modelos de ensino e compreensão da aprendizagem da leitura e da escrita que foram teorizados e elaborados ao longo da história, a professora fez uma discussão sobre a abordagem corrente de teoria. Anne-Marie explicou que abandonaria a visão de teoria como “bandeira ou espada” - que, em sua visão, busca chegar a um objetivo comum a partir de elementos ordenados que tentam dar “uma visão global simplificada” para “tornar compreensíveis situações ou realidades complexas” - propondo mais “encontrar ao longo dos séculos perplexidades relativas à leitura e à escrita, que muitas teorias tentaram resolver.”
 
Anne-Marie discutiu teorias desde o século XVIII, fazendo um mapeamento histórico das mudanças de visões e abordagens em torno da aprendizagem da leitura e da escrita. Em suas conclusões, a professora francesa afirmou que não se deve confundir procedimento pedagógico com modelo psicológico, e defendeu que “uma teoria dá um modelo geral estatisticamente validado, mas nenhuma turma [de alunos] é uma amostra ‘representativa’” e que “nenhuma teoria nos fornece diagnósticos seguros para definir uma intervenção pedagógica ‘aqui e agora’”.
 
O IV CONBAlf foi encerrado com os agradecimentos da presidente da ABAlf Isabel Frade e a canção “Encontros e despedidas”, de Milton Nascimento e Fernando Brant, tocada no auditório.
 

Assista abaixo às mesas e conferências do IV CONBAlf na íntegra em nosso canal: