Novas mídias em sala de aula (3)


     

Letra A • Sexta-feira, 15 de Maio de 2015, 14:58:00

Dificuldades dos professores

De acordo com o Educacenso de 2007, a média de idade dos alfabetizadores do país era de 38 anos à época. Por terem crescido e se formado em um momento em que as mídias digitais ainda eram incipientes e se restringiam a uma pequena parcela da população, muitos professores encontram dificuldades para inseri-las nas aulas. Para Jarbes Torres, que ministra aulas de formação tecnológica para professores de comunidades rurais, a falta de familiaridade com as tecnologias desestimula: “Por não terem passado por um curso básico de informática, eles têm dificuldade para manusear o mouse, para conhecerem as teclas do computador e os conceitos iniciais da informática. Então muitos acabam desistindo do curso”, lamenta.

Para Marcelo Buzato, o educador pode se sentir inseguro para tentar extrair o potencial das novas mídias no modelo tradicional de ensino, que ainda enxerga a internet e as redes sociais como distrações. “Em geral, o professor vai sentir o computador entrar em sala de aula como um risco a sua autonomia e competência, por uma série de implicações técnicas que ele não entende. Por outro lado, se ele deixa os alunos à vontade, vai ser cobrado depois por um desempenho que não pode garantir”, avalia o pesquisador.

Segundo Ana Paula Knaul, o currículo dividido em disciplinas contribui para que a tecnologia se restrinja aos laboratórios de informática, sendo preciso que a interdisciplinaridade englobe os novos meios: “Ao trabalharmos com a noção de território, em Geografia, podemos utilizar o Google Maps, por exemplo. É necessário integrar o currículo, porque se a tecnologia ficar apenas no laboratório, fragmenta o conhecimento e torna o ensino [da tecnologia] instrumental, sem desenvolver o pensamento crítico”, aponta.                               

Mesmo quando possui boa formação tecnológica, o professor encara dificuldades estruturais, como o envelhecimento dos equipamentos e os diferentes níveis de familiaridade dos alunos com as mídias digitais. O acesso às tecnologias possibilita o exercício de outros direitos e, por isso, deve ser garantido entre as crianças que chegam à alfabetização sem conhecerem as tecnologias. “Os alunos de classes mais favorecidas têm computador em casa, celular com internet. Os que não têm ficam para trás, por não terem formação em letramento digital e não aprenderem a lidar com aquele tipo de linguagem. E não é justo. É preciso garantir esse acesso”, destaca Carla Coscarelli.

Outro papel para o professor?

“É muito difícil eles me chamarem para resolver um problema técnico, eles sabem que às vezes não posso ajudar porque na hora eu não sei”. A fala da professora Simone de Souza sobre a autonomia dos alunos para desvendar os aspectos técnicos das novas plataformas reflete uma mudança latente percebida por vários entrevistados do Letra A: a descentralização da figura do professor, que tende a se intensificar conforme essas plataformas chegam à sala de aula.

Normalmente tido como o “dono do saber”, o professor muitas vezes é surpreendido pelo conhecimento prévio das crianças nas aulas sobre as novas mídias. “Os alunos estão se sentindo mais importantes, mais autônomos. Quando peço para entrarem na internet, para procurarem algo no Google, eles já sabem. Uma vez fomos pesquisar sobre caricaturas na Wikipedia e um aluno falou que era muito cansativo ‘ler aquelas letrinhas’. Aí o outro já respondeu que era só clicar numa ‘bolinha’ no canto superior da tela para aumentar as letras. Algumas vezes eu vou passar para eles alguma informação e eles já voltam com uma informação extra", conta Maria de Fátima Cafieiro.

Mais que detentor do conhecimento, o professor se torna o responsável por mediar criticamente a leitura que as crianças fazem das tecnologias e das informações nelas obtidas. Em uma das aulas em que utilizaram tablets, por exemplo, os alunos de Ana Paula Knaul jogaram um game no qual o representante do jogador na tela era um pinguim. A própria curiosidade das crianças sobre o animal deu espaço para que a professora mediasse o contato delas com as informações contidas no cenário. “A intenção era problematizar o que era verdadeiro no jogo, o que realmente faz parte do habitat do pinguim. As crianças, por meio da escrita coletiva, registraram no quadro o que viram na tela, e daí fomos elencando o que fazia realmente parte e o que era fictício”, relata a professora.

Em outro momento histórico, o papel docente de transmitir conteúdos se justificava pelas dificuldades de acesso a informações por grande parte da população. Hoje, essa lógica perde força, como explica Denise Bértoli Braga, professora da Unicamp e pesquisadora na área de Linguagens e Tecnologias. Segundo ela, quando as pessoas não necessariamente tinham livros, o educador precisava garantir o acesso a conteúdos básicos. Hoje, no entanto, essas informações já estão online. O momento, então, seria o de ajudar as pessoas a acharem e a filtrarem esse vasto conteúdo disponível na rede: “É preciso ser crítico do que está na internet. O professor tem tanto que estimular a aprendizagem em grupo, como a que se dá nos fóruns na internet, quanto dar autonomia às crianças desde cedo. Precisamos que as pessoas aprendam a aprender.”

Continue lendo

Novas mídias na sala de aula - Parte 1

Novas mídias na sala de aula - Parte 2

Atividades de leitura e escrita para os meios digitais