Olhar atrás para pensar à frente

II SIHELE tem foco na história dos métodos e do material didático


     

Acontece • Terça-feira, 23 de Julho de 2013, 14:03:00

“A experiência entendida como história não é ‘um carro com os faróis voltados para trás’, como diria Pedro Nava. Ela nos ajuda a errar menos e a acertar mais”. As palavras são de Maria Zélia Versiani, diretora do Ceale, na mesa de abertura do II Seminário Internacional sobre a História do Ensino da Leitura e da Escrita (SIHELE), realizado pela Associação Brasileira de Alfabetização (ABAlf) nos dias 11 e 12 de julho de 2013. Depois de três dias intensos de CONBAlf, ganharam protagonismo nos auditórios do CAD 1, na UFMG, as discussões sobre a história dos processos de alfabetização.


Homenagem emocionada

Após a abertura do II SIHELE, Circe Bittencourt foi chamada ao palco para prestar uma homenagem ao pesquisador Alain Choppin. Circe destacou sua importância para a história da educação e da alfabetização: “Foi graças a Alain Choppin que o livro didático - um livro menor, pequeno e desvalorizado no momento em que ele começou suas pesquisas - passou a ser visto sobre outro aspecto, o aspecto de sua enorme complexidade”.

Como professor secundário, Alain Choppin começou a se preocupar com o livro didático, que na década de 70 era considerado um vilão na vida de professores e alunos. Para o estudo desse objeto aparentemente banal, Choppin desenvolveu um arcabouço teórico e metodológico que resultou na criação de um banco de dados nomeado Emmanuelle. Além do pioneirismo do banco de dados, Circe ressaltou a importância do Emmanuelle, que proporciona informações sobre a trajetória de cada livro, fornecendo o percurso da obra desde sua primeira edição até as atuais.

Emocionada, a pesquisadora afirmou que Alain Choppin iniciou e deu origem a uma nova visão sobre a própria historia da educação escolar, contribuindo para uma reflexão intensa e atual para a formação de professores em suas práticas cotidianas na vida escolar.


Ler a leitura

A conferência de abertura contou com uma fala de Roger Chartier, professor do Collège de France e da École de Hautes Études en Sciences Sociales, ambos em Paris. “O tema da leitura indica uma revisão sociológica e histórica sobre as práticas de leitura, sobretudo dos livros e sua presença ou apagamento nas sociedades contemporâneas”, ele afirmou.

O pesquisador questionou os diagnósticos atuais que têm atestado a morte do leitor, tendo por base a diminuição do número de jovens que leem mais de 20 livros por ano ou a redução do número global de livros vendidos. De acordo com essa perspectiva, o desaparecimento da leitura seria consequência inevitável da civilização da tela, do triunfo das imagens e da comunicação eletrônica.

Mas, segundo Chartier, há dois sentidos para ler: o literal, correspondente à leitura das letras, que supõe a alfabetização e domínio da língua escrita; e o metafórico, que ocorre depois de ler o livro, referente a ler o mundo, com a memória e os sentimentos. Ler a leitura, para o pesquisador, é entender as relações entre esses dois sentidos do verbo ler. E a história tem nos mostrado a diversidade da prática da leitura: podemos, por exemplo, ler em voz alta, silenciosamente, intensivamente, de pouco em pouco, por estudo ou prazer. É preciso levar em conta essas variadas formas de ler antes de fazer qualquer diagnóstico generalizado da leitura.

Chartier afirma: olhar para a história ajuda a entender que a leitura passa por várias revoluções. Por isso, devemos perceber que o leitor não está morrendo, mas passando por uma série de mudanças. “A história da leitura mostra que as mutações da ordem das práticas são, frequentemente, mais lentas que as revoluções das técnicas”. Ou seja: nossa maneira de ler não se transforma imediatamente. Além disso, a diminuição no faturamento de livrarias, por exemplo, pode ser explicada pelos novos hábitos de compra de livros pela internet, supermercado e multimídia.

A revolução digital traz a necessidade de invenção de novas formas de se garantir o interesse. Além disso, muda a forma material e a prática de leitura simultaneamente, obrigando-nos a fazer uma radical revisão dos gestos e das noções que associamos à escrita. Chartier acredita que o sonho da biblioteca universal, onde poderemos acessar todas as obras que foram publicadas, está cada vez mais próximo.

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