Paragrafação

Ensinar noções de parágrafo já no início da alfabetização ajuda a criança a compreender que um texto é composto por ideias, e que é preciso organizá-las


     

Letra A • Sexta-feira, 15 de Maio de 2015, 15:39:00

Por Fabíola de Paula

Após leitura e conversa sobre o livro “O bichinho da maçã” (de Ziraldo), a professora do ciclo de alfabetização Eliana Carleto, da Escola de Educação Básica da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), começou a trabalhar com os alunos a noção de parágrafo. Após contarem a quantidade total desse elemento no texto, ela propôs uma atividade: sublinhar de amarelo o parágrafo que indica quem morava dentro da maçã; de azul, aquele com a descrição deste personagem; de vermelho, o que informa quem chegou para atrapalhar a vida do bichinho; e, por fim, de verde, o parágrafo que destaca o que o bichinho fez ao perceber que seria devorado.

A associação de uma cor diferente para cada parágrafo ajudou a demonstrar para a turma, de forma bem marcada visualmente, que são informações diferentes e, por isso, estão em parágrafos diferentes. Para Eliana, introduzir o ensino da paragrafação (a organização do texto em parágrafos) no ciclo de alfabetização ajuda a criança a “perceber que o texto é constituído de ideias”. “O domínio da habilidade de paragrafar favorece o aluno na sua tarefa de organizar, da melhor forma possível, as informações trazidas ao longo do texto”, afirma.

Tal habilidade de organizar o texto em blocos lógicos de sentido é mobilizada junto a outros conhecimentos linguísticos, como a pontuação e a estruturação dos períodos, segundo a professora da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) Leila Nascimento da Silva. Além disso, outra característica da paragrafação é a de guardar certas regularidades conforme o gênero textual. “É próprio de alguns gêneros uma organização ‘em bloco único’, sem paragrafar; outros exigem uma paragrafação muito mais intensa, pelo tamanho e pela complexidade do tema”, explica.

Leila recomenda que o professor não espere que a alfabetização esteja consolidada para discutir esse aspecto central da produção de textos, podendo começar com atividades coletivas nos anos iniciais. “É possível entregar um pequeno texto escrito em bloco único para que os alunos ajudem a organizar, para que fique mais claro e os períodos fiquem com lógica nessa organização”, sugere. “Ou então, ao contrário, entregar textos fatiados para que eles consigam perceber que uma parte complementa a outra e constrói essa teia textual”, completa Leila.

Explorando roteiros

A professora Ana Maria Teixeira, do ciclo de alfabetização da Escola Municipal Maria de Rezende Costa, em Belo Horizonte (MG), também busca desenvolver a habilidade da paragrafação nos anos iniciais. No ano passado, a questão foi trabalhada em um projeto de intercâmbio de cartas entre alunos do 3º ano de escolas distintas, que passaram a compartilhar por escrito experiências de seus cotidianos.

Para as primeiras cartas, Ana Maria apresentou um roteiro pré-definido: ela entregava aos alunos uma folha padrão, dividida em quadros, cada um trazendo uma ideia central a ser desenvolvida ali. Por exemplo, na carta cujo tema era “Gostos Pessoais”, havia um quadro para o aluno escrever sobre o que gostava de fazer; outro para falar sobre o que não gostava; e no seguinte deveria falar sobre lugares que gostaria de conhecer. Assim que os alunos compreenderam que uma carta pode conter vários assuntos, mas em parágrafos diferentes, a professora os deixou escrever cartas mais livremente, “citando temas que achassem mais relevantes para falar com o amigo da outra escola”, conta. “Mas sempre colocava no quadro algumas palavras-chave para que eles organizassem o pensamento”, conclui (ver modelo de roteiro ao lado).

Dificuldades no processo

Ao pesquisar práticas de ensino de parágrafos nos anos iniciais, Leila Nacimento da Silva observou que uma dificuldade dos professores é o fato de estarem apegados a um conceito padrão de paragrafação: um parágrafo de introdução, outro de desenvolvimento e um terceiro de conclusão. “Visto desse modo, um texto teria que ter, no mínimo, três parágrafos; e não é bem assim”, alerta. Por isso, Leila relembra a importância de se trabalhar os parágrafos a partir dos gêneros textuais.

Entre os alunos, a escrita de parágrafos com ideias inconclusas e a inexistência de blocos de ideias estão entre as dificuldades mais comuns, segundo Eliana Carleto. Por isso, ela afirma que o professor não pode se limitar a dar alertas como “Não se esqueçam do parágrafo!”, mas deve de fato tematizar a paragrafação como objeto de ensino. “Como saber onde dividir? Em quantas partes? Todo texto pode ser dividido?” são algumas das reflexões que Eliana busca levantar em sala de aula. “No entanto, a pouca existência de materiais que orientem o professor na condução desse ensino pode ser um dos aspectos que suscita um trabalho assistemático com a paragrafação”, conclui.